Desde os primeiros até os nossos últimos momentos na vida, dormir faz parte do que somos. Passamos cerca de um terço de nossas vidas dormindo, e a complexidade desse simples ato vai bem além do fechar dos olhos. O sono é um mecanismo que nosso corpo utiliza para diversas funções de manutenção, e é extremamente importante para nossa saúde. Possuímos diversos mecanismos regulatórios do ciclo de sono e vigília, por exemplo o acúmulo de substâncias sonogênicas (que promovem o sono) durante os períodos de vigília, que causam uma necessidade de dormir, notadamente a Adenosina, um importante componente do metabolismo celular. Secretada pelo prosencéfalo basal, uma região intimamente associada com o controle o ciclo sono-vigília, a adenosina se acumula durante os períodos de vigília e pode suprimir a atividade neural e induzir ao sono. Os mecanismos de ativação neural que controlam o sono, no entanto, ainda não estão bem estabelecidos.
Com base nisso, pesquisadores chineses resolveram investigar o papel de neurônios colinérgicos e glutamatérgicos, que secretam dois diferentes neurotransmissores (acetilcolina e glutamato, respectivamente) através do uso de um sensor molecular que responde com fluorescência a diferentes concentrações de adenosina no meio. Além disso, usaram técnicas para desabilitar o prosencéfalo basal e EEG para o exame de polissonografia em camundongos.
O que os cientistas descobriram foi que a adenosina realmente se encontra em níveis mais altos quando os camundongos estão acordados do que quando em sono não-REM, mas em sono REM os níveis de adenosina são ainda mais altos do que na vigília. A rapidez na mudança dos níveis de adenosina nos camundongos sinaliza que há um componente de atividade neuronal na liberação dessa substância, o que levou os cientistas a estudarem esse aspecto. Com isso, os cientistas resolveram testar dois diferentes tipos de neurônios do prosencéfalo basal: os neurônios colinérgicos e os glutamatérgicos, que, quando ativados, promovem o estado de vigília nos animais. Eles observaram que os neurônios glutamatérgicos induzem um aumento mais expressivo do que os colinérgicos de adenosina nessa região do cérebro. Além disso, quando esses neurônios eram inativados, os níveis de adenosina sofriam uma redução significativa tanto em vigília quanto durante o sono REM. Por fim, os pesquisadores viram que a perda da função desses neurônios prejudica a homeostase do sono, uma vez que os camundongos com deficiência nesses neurônios passavam mais tempo em vigília do que os outros, além de passarem menos tempo em sono não-REM após privação de sono.
Esse estudo demonstrou importantes mecanismos de que o nosso cérebro lança mão para regular o nosso sono. A compreensão dessa maquinaria é de grande importância para que possamos compreender melhor os distúrbios do sono e entender melhor como nosso corpo funciona e abre oportunidades para estudar como a privação de sono a longo prazo pode modificar essas funções. Num momento em que o trabalho é tão priorizado em detrimento das mais básicas funções fisiológicas, é importante que possamos compreender o que isso vai nos trazer no futuro.
Imagens:
capa: Flaming June (1895), por Frederic Lord Leighton
Carel Fabritius - De poort bewaker (1654)
derivative work: V85 (talk) Bank-Security-Guard-Sleeping.jpeg: FlickreviewR / CC BY
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