A prática regular de exercícios físicos tem sido amplamente estudada e demonstrou ter efeitos benéficos na redução dos níveis de cortisol, um hormônio do estresse produzido pela glândula adrenal. Essa redução do cortisol pode ter um impacto positivo na saúde mental, podendo atuar sobre distúrbios como transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). Aqui, vamos discutir como os exercícios físicos podem diminuir o cortisol e apoiar o processo de ressignificação de memórias traumáticas.
Todos nós sabemos da importância para a saúde da prática regular de atividade física. Essa atividade pode atuar na regulação de neurotransmissores, no aumento do fluxo sanguíneo no cérebro (o que pode ser mensurado pelo NIRS), neurogênese e aumento da vascularização cerebral. Isso tudo tem reflexo no âmbito fisiológico e ajuda a modular as nossas emoções, atuando na tão estimada manutenção da saúde mental. Achados revelam, por exemplo, que enquanto o exercício de baixa intensidade ativa as redes que se relacionam ao controle da cognição e ao processamento da atenção, o exercício de alta intensidade tem as regiões envolvidas no processamento emocional/afetivo ativadas primeiramente. Trabalhos mostraram que o exercício reduz significativamente os níveis de cortisol em indivíduos com depressão, sugerindo um efeito benéfico no gerenciamento do estresse e na regulação hormonal. Além disso, essa redução nos níveis de cortisol podem modular as respostas imunológicas, promovendo um envelhecimento saudável. O cortisol é um hormônio liberado pelo corpo em resposta ao estresse. Quando estamos expostos a eventos traumáticos, nossos níveis de cortisol podem aumentar significativamente.
O TEPT se baseia em episódios involuntários de perturbações psicológicas fisiológicas desencadeadas por gatilhos que remetem algum evento traumático já vivido, como por exemplo agressão física ou sexual, assalto, sequestro, acidentes entre outros. Os sintomas envolvidos podem ser sudorese, náusea e tremores, prejuízos sociais, freezing (estado de choque), depressão, ou até mesmo desenvolvimento de outros transtornos como o transtorno dissociativo de identidade. O tratamento consiste em psicoterapia e medicamentos como antidepressivos e ansiolíticos. Quando estamos expostos a eventos traumáticos, nossos níveis de cortisol podem aumentar significativamente. Isso pode levar a uma série de efeitos negativos na saúde mental, incluindo a consolidação e intensificação das memórias traumáticas. As memórias traumáticas podem persistir como flashbacks vívidos e intrusivos, causando angústia emocional e afetando negativamente a qualidade de vida das pessoas. Quando nos envolvemos em exercícios físicos, nosso corpo libera endorfinas, conhecidas como "hormônios da felicidade", que podem ajudar a reduzir a ansiedade e melhorar o humor. Esses efeitos positivos no bem-estar emocional podem ter um impacto significativo na forma como lidamos com memórias traumáticas. A prática regular de exercícios físicos pode promover um estado de relaxamento e calma, facilitando a abertura para o processamento e a resignificação de memórias traumáticas.
Trabalhos indicaram que a prática de exercícios físicos estava associada a uma redução significativa dos sintomas do TEPT, incluindo a diminuição da gravidade das memórias traumáticas, ajudando a promover a extinção das respostas condicionadas às memórias traumáticas, facilitando o processo de resignificação e recuperação. Além disso, a atividade física também tem sido associada a melhorias na cognição e na plasticidade cerebral. Estudos recentes mostraram que o exercício aeróbico está relacionado ao aumento do volume do hipocampo, uma região do cérebro envolvida na memória e no processamento emocional. Além disso, o exercício melhora a neuroplasticidade e estimula a produção de fatores de crescimento no cérebro, resultando em melhorias na memória, que junto com a redução dos níveis de cortisol, fornece um ambiente neuroprotetor. Essas alterações neurobiológicas podem facilitar a capacidade do cérebro de reinterpretar e ressignificar memórias traumáticas, promovendo a recuperação e a adaptação saudável. É importante ressaltar que, embora os exercícios físicos possam ser benéficos no processo de resignificação de memórias traumáticas, eles devem ser utilizados como parte de uma abordagem terapêutica mais abrangente. É fundamental buscar o acompanhamento de profissionais qualificados, como terapeutas e psicólogos, para garantir um suporte adequado e personalizado durante esse processo.
Como vimos, os exercícios físicos podem desempenhar um papel importante na redução dos níveis de cortisol e facilitar o processo de ressignificação de memórias traumáticas. No entanto, é fundamental combinar os exercícios físicos com abordagens terapêuticas adequadas para um tratamento efetivo de memórias traumáticas, e para isso, é imprescindível que protocolos mais efetivos sejam criados. Dessa forma, trabalhos futuros correlacionando a prática de protocolos de atividade física e a melhora do TEPT investigando atividade cerebral (NIRS e EEG) e os níveis de cortisol são importantes para o avanço do tratamento de tal transtorno.
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